A lei complementar sancionada pelo prefeito Evandro Leitão, que altera o Código Tributário de Fortaleza, passou por adaptações importantes em relação ao texto originalmente enviado à Câmara. O artigo que redefinia o conceito de valor venal, aproximando-o explicitamente do valor de mercado, foi retirado da versão final. A mudança era fortemente criticada por tributaristas, que apontavam possível inconstitucionalidade com base no artigo 110 do Código Tributário Nacional.
A exclusão desse dispositivo, no entanto, não elimina o risco de aumento do IPTU nos próximos anos. Isso porque os demais artigos que estruturam a forma de calcular e atualizar a base do imposto foram mantidos integralmente.
Por que o risco de aumento permanece
Mesmo sem alterar o conceito formal de valor venal, a nova lei determina que:
A base do IPTU deve ser atualizada, pelo menos a cada quatro anos, “de acordo com o valor de mercado”
O mudança do artigo 271, aprovada sem modificações, obriga o Município a revisar periodicamente o valor dos imóveis com base no comportamento do mercado imobiliário, e não apenas por índices de inflação.
A lei autoriza o uso de inteligência artificial, geoestatística e bancos privados de dados imobiliários
O novo artigo 268-A permite que a Administração Tributária utilize modelos avançados para estimar valores venais, considerando fatores como padrão construtivo, localização, infraestrutura e valorização imobiliária.
Na prática, isso aproxima ainda mais o valor venal do preço real de mercado, mesmo sem mudança formal do conceito.
A base será corrigida anualmente pelo IPCA-E
Nos anos em que não houver atualização completa, o valor será reajustado pelo IPCA-E, índice historicamente acima de outros indicadores inflacionários.
O aerolevantamento de 2023 produzirá efeitos a partir de 2026
A lei aprovada acrescentou um dispositivo inédito: as atualizações cadastrais feitas por aerofotogrametria valerão em 2026.
Isso significa que metragens, ampliações e novas construções já mapeadas serão incorporadas à base do IPTU — ampliada pelos novos critérios técnicos.
Aumento depende agora da nova Planta Genérica de Valores
Apesar das mudanças, ainda não é possível afirmar matematicamente qual será o impacto sobre o IPTU. A definição final da cobrança dependerá da elaboração de uma nova Planta Genérica de Valores (PGV), instrumento que estabelece o valor venal de referência de terrenos e edificações em toda a cidade.
A atual PGV está defasada, e uma revisão profunda — já esperada para os próximos anos — pode resultar em:
• atualização geral das zonas de valor;
• incorporação das áreas urbanas que mais se valorizaram;
• redistribuição do peso tributário entre bairros;
• revisão de isenções e faixas de cobrança.
Se a Prefeitura optar por uma PGV mais alinhada ao mercado imobiliário, como a nova lei autoriza, o aumento será praticamente inevitável em áreas valorizadas.
Por que o artigo removido não muda o cenário central
A exclusão do que seria o novo artigo 267 — que aproximava expressamente valor venal de valor de mercado — evitou um conflito jurídico direto. Mas os mecanismos operacionais que permitem essa equivalência foram mantidos.
Tributaristas ouvidos por O Veredito classificam a mudança como “cosmética”, pois a mudança de definição foi retirada, mas preservou-se o mecanismo que produz o mesmo resultado.
Ou seja, o risco permanece não por causa do texto original, mas porque o texto sancionado ainda permite revisões que tendem a aumentar a base de cálculo do IPTU.
Próximos passos
Com a lei já em vigor, três movimentos serão decisivos:
1. Regulamentação da Prefeitura, que definirá metodologias e parâmetros usados pela inteligência artificial e pelos sistemas técnicos.
2. Revisão da PGV, que deve ocorrer antes da atualização obrigatória da base.
3. Aplicação dos dados do aerolevantamento, que entrará em vigor em 2026.
Somados, esses elementos definirão se o contribuinte vai, de fato, pagar mais.